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O FUTEBOL

A primeira identidade esportiva do Vasco da Gama não era o futebol e sim do remo, modalidade que, naquela época, alcançara uma organização invejável, sendo inclusive, desde 1897, possuidora de uma federação própria.

Entretanto, já na década de 1910, as regatas passaram a dividir a atenção do público com o futebol, esporte oficialmente trazido ao Brasil em 1894, pelas mãos de um paulistano, filho de britânicos, chamado Charles Miller, considerado por muitos como o introdutor dessa modalidade no Brasil. O foot-ball, como era chamado na época, não tardou a estender os seus tentáculos em direção à então capital federal e o fez pela figura de Oscar Cox, que, em 1897, recém-chegado da Suíça, onde estudara durante alguns anos, não se esqueceu de trazer na bagagem de volta ao nosso país, uma bola para a prática da nova modalidade desportiva.

Voltando à história do Vasco da Gama, no dia 20 de julho de 1913, o Botafogo F.C. convidou um combinado português formado por jogadores do Benfica, Lisboa e Clube de Tiro & Sport, que excursionava pelo nosso país. A vitória da equipe visitante por 1 x 0 gerou um clima de euforia no seio da numerosa colônia portuguesa residente no Rio de Janeiro. Não tardou para que surgissem três clubes dedicados exclusivamente à prática futebolística: o Centro Esportivo Português, o Lusitano (que tiveram curta duração) e o Lusitânia F.C.

Exatamente o Lusitânia, recusado em 1915 pela Liga Metropolitana de Sports Athléticos (L.M.S.A), devido ao seu regulamento altamente restritivo (só permitia a presença de portugueses), uniu-se nesse mesmo ano ao Club de Regatas Vasco da Gama, que admitia a presença de brasileiros em seu quadro associativo, dando início ao departamento de futebol do clube. A fusão foi oficializada no dia 26 de novembro de 1915, apesar da oposição do grupo de remadores vascaínos. 

Como toda equipe iniciante, o Vasco teve que começar pela base da pirâmide futebolística. Da Terceira Divisão, para ser mais exato. A estréia, marcada para o dia 3 de maio de 1916 não poderia ter sido mais desastrosa: a derrota por 10 x 1 para o Paladino parecia mostrar que se tratava de apenas mais um clube de duração efêmera, um delírio da colônia lusitana.

A partir de 1917, teve início a grande virada. O nível da equipe começou a melhorar, graças à aceitação de jogadores pobres, notadamente negros e mulatos, escolhidos nas peladas do subúrbio e em clubes pequenos.

É preciso deixar bem claro que a aceitação desses atletas em nada se deveu a uma desinteressada expressão de benevolência por parte dos dirigentes vascaínos. Naquela época, tal prática era bastante difundida nos clubes suburbanos e equipes ligadas ao ambiente fabril. A grande diferença foi que, o Vasco da Gama, por ter o suporte financeiro de parte da colônia portuguesa, tinha condições de recrutar aqueles elementos que mais se destacavam nas peladas e equipes suburbanas, algo totalmente fora de cogitação entre as equipes de maior tradição, compostas por acadêmicos, filhos das “boas famílias” cariocas.

Entretanto, muito antes do Vasco da Gama passar a adotar negros, mestiços e operários em suas fileiras, tal atitude já era prática comum em outras agremiações, como foi o caso do Andaraí, no início da década de 1910. Sendo que, o papel de pioneiro em relação à aceitação de membros das camadas menos favorecidas cabe ao Bangu Atlético Clube, que já em 1905 apresentava em seu time principal o operário negro Francisco Carregal (PEREIRA, 2000). Vejamos então qual o verdadeiro papel desempenhado pelo Vasco da Gama em relação ao processo de democratização pelo qual passou o futebol brasileiro a partir da década de 1920.

 

O time de 1923: O futebol assume novas caras

Apesar do exemplo pioneiro dado pelo Bangu ainda na primeira década do século passado, durante longo tempo, a discriminação racial no futebol foi algo institucionalizado, fazendo parte, inclusive, dos regulamentos de instituições esportivas como o Club Sportivo dos Liberais que, em 1906, deixava bem claro em seus estatutos que aceitava um “ilimitado número de sócios de qualquer nacionalidade, exceto pessoas de cor”. (PEREIRA, 2000, p.66).

Em 1923, o Vasco da Gama estreava na Primeira Divisão do futebol carioca. A princípio, a chegada de uma equipe recheada de jogadores negros, mulatos e brancos pobres foi minimizada pelos dirigentes das grandes equipes, pois esportistas com essas características não eram figuras raras de se encontrar, principalmente em equipes ligadas ao setor fabril, como Bangu, Vila Isabel e Andaraí. Somente quando a bola começou a rolar é que o Vasco passou verdadeiramente a incomodar à elite esportiva e social da capital federal. O triunfo daquele escrete totalmente fora dos padrões do futebol praticado na época representou um verdadeiro escândalo. Jamais um time com tais características, desafiara a hegemonia dos jovens bem nascidos, bem educados e bem nutridos de Fluminense, Botafogo, América e Flamengo.

A reação contrária ao sucesso do conjunto debutante foi imediata. Logo surgiram acusações de que os seus jogadores não passavam de profissionais disfarçados, o que era proibido na época. Como o profissionalismo ainda estava longe de ser admitido, os jogadores foram todos registrados como funcionários dos estabelecimentos comerciais dos portugueses. Dessa forma burlavam as leis estabelecidas pela Liga e pela comissão de sindicância da entidade. Quando seus principais membros, Reis Carneiro, do Fluminense, Armando de Paula Freiras, do América, e Diocésano Ferreira Gomes, do Flamengo e do Correio da Manhã chegavam às firmas lusitanas para constatar a veracidade das informações do Vasco, os gerentes alegavam que os empregados estavam realizando “serviços externos”.

Caso emblemático, que bem mostra a antipatia que o team cruzmaltino despertava em seus adversários, ocorreu, no dia 8 de julho de 1923, quando o Estádio das Laranjeiras abrigou o match entre as equipes do Vasco da Gama e Flamengo. Boa parte da platéia que lotou as dependências do ground tricolor era composta por torcedores do Fluminense, Botafogo e América, que se uniram para torcer pelo Flamengo, algo difícil de se imaginar nos dias atuais. Com a vitória do time da Rua Paissandú, contra o onze da Morais e Silva por 3 a 2, ao término da partida, as torcidas adversárias promoveram um verdadeiro carnaval fora de época pelas ruas da zona sul da cidade, festejando a vitória dos “filhos de boas famílias” sobre o time dos “caixeiros, negros e analfabetos”. Ainda como parte das comemorações, a estátua de Pedro Álvares Cabral amanheceu com “réstias de cebola e plantaram tamancos de 2m de altura na frente da sede do Vasco, na Rua Santa Luzia, no centro” (PLACAR, s/d, p.28).

 

Fonte: Wilkipédia